Sambista de Passos muda nome artístico em combate ao racismo
Na semana da consciência negra, decisão repercutiu especialmente no meio acadêmico de Passos
Na semana de celebração da Consciência Negra, o artista passense Junior Fábio da Silva, tomou atitude no combate ao racismo: a mudança do seu nome artístico de cunho racista. Juninho era conhecido como “Juninho 17”, número usado em referência ao macaco, no jogo do bicho. O comunicado da mudança ocorreu na terça-feira, 21, por meio de um vídeo que ele divulgou em suas redes sociais. Veja aqui
“Não quero carregar ainda mais racismo nas costas”, afirmou o sambista. Ele conta que sempre levou o apelido “na brincadeira”, e hoje compreende a importância de se combater o racismo disfarçado de piadas e frivolidades que normalizam a violência aos negros. “Eu quero mostrar para as crianças negras que elas não precisam aceitar tudo, que não é correto ‘aceitar tudo', racismo não é brincadeira, é muito sério”, explica Juninho.
Juninho da Silva é um dos mais conhecidos sambistas de Passos, integrante da animada banda Divino Samba. Começou na música em 1994 e já em 1996, começou a tocar cavaquinho e a partir do ano 2000 passou a tocar também o banjo que se tornou o principal instrumento, sua marca registrada.
Juninho participou dos grupos “Bombocado”, “Complexo B”, “Samba Só” e vários outros. Em 2008, decidiu seguir também carreira solo e hoje participa de apresentações próprias, com grupos parceiros ou ainda músico de apoio de artistas que se apresentam em Passos, como Ferrugem, Marcio Art, Beleléu, Lucas Morato e Eder Miguel.
A reflexão acerca da mudança do nome artístico surgiu recentemente, quando Juninho e o amigo Vinícius Leal compuseram uma música sobre racismo. “Eu percebi que não estava certo eu cantar, fazer uma música que fala sobre racismo e usar um nome que reforçava ainda mais o racismo”.
REPERCUSSÃO
A decisão de Juninho ganhou repercussão, especialmente no meio acadêmico de Passos. O jornalista e pesquisador de relações étnico-raciais para uma educação antirracista Maurício Mello, professor dos cursos de jornalismo e comunicação social da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG) de Passos, comentou a atitude do artista e ressaltou a importância de se combater o chamado “racismo recreativo” que deixa as pessoas confortáveis para agredir em forma de brincadeira.
“O Juninho alterou seu nome artístico pois ele despertou em termos de consciência racial. Apelido criado dentro de uma ação que chamamos de ‘racismo recreativo’ deve sim ser rechaçado como todas as piadas e brincadeiras de teor preconceituoso”, avalia. “É importante perceber que se continuarem a associar pessoas pretas a essas denominações animalescas, a opressão racial na sociedade brasileira se naturaliza”.
O membro do grupo Cotas Municipais para Pessoas Pretas, Alexandre de Almeida, também ressaltou a importância da atitude do artista passense no combate aos apelidos pejorativos de cunho racista. “O Juninho é um ser humano ímpar que sempre está lutando e colaborando pela causa do povo preto e de periferia, então nada melhor que valorizar a identidade. Nós sabemos que termos pejorativos deixam as pessoas em condições de vulnerabilidade, de fragilidade, então eu acho que o Juninho está tendo essa responsabilidade com o peso do nome dele, ele está corretíssimo”, avaliou Alexandre que também chamou a atenção para o despertar da consciência negra que está aumentando os espaços de diálogos e resistência.
“O racismo sempre existiu, mas agora nossas atitudes estão sendo mais firmes, mais contundentes, pessoas que antes não falavam sobre o tema agora estão debatendo, então o diálogo é a melhor forma da gente acabar com qualquer mazela da nossa sociedade, então, quando o Juninho faz essa proposta de mostrar o que esse nome representa como um nome pejorativo, ele vai estar dando dignidade para alguns meninos que estão nas salas de aula, nas periferias nas comunidades”, destacou.
FEIRA AFRO
O empreendedor Reinaldo Alves de Barros, que é uma das lideranças do movimento negro jovem de Passos e produtor cultural idealizador da FEIRA AFRO, também comemorou a coragem do artista do samba e amigo. “Ao optar por mudar um apelido com significado racista para um nome mais significativo, a pessoa está demonstrando um compromisso com a promoção da igualdade e respeito. Essa iniciativa pode contribuir para um ambiente mais inclusivo, onde todos se sintam valorizados e respeitados. Além disso, pode inspirar outros a repensarem suas atitudes e contribuir para uma cultura mais consciente e antirracista”, avaliou o idealizador da Feira AFRO de Passos que vai levar diversas atividades temáticas para o Mercadão Municipal durante os dias 24, 25 e 26 em meio às celebrações da Consciência Negra, comemorada no dia 20 de novembro. (Veja programação abaixo)
“O Dia da Consciência Negra é uma oportunidade crucial para refletir sobre a história, cultura e contribuições dos afrodescendentes, além de destacar a persistência das desigualdades raciais. É um convite para examinarmos nossa sociedade, reconhecermos a importância da diversidade e trabalharmos juntos na promoção da igualdade, respeito e justiça para todos. Essa luta é de todos nós e esperamos um mundo melhor a cada dia, para que nós negros tenhamos equidade em toda área da sociedade e que nossa geração venha ocupar e transformar o nosso país em um novo tempo de igualdade”, disse Reinaldo.
Veja a programação da Feira Afro: