Pessoas em situação de rua: falta política pública para essa questão?

Aumenta o número de pessoas em situação de rua em Passos

Pessoas em situação de rua: falta política pública para essa questão?
Pessoas em situação de rua dormem pelas ruas e avenidas

Duas visões diferentes sobre um mesmo assunto para você formar a sua opinião:

 

A cidade de Passos nunca teve tantos pedintes como agora, situação que vem se agravando nos últimos quatro anos devido à falta de uma política pública de atendimento e encaminhamento das pessoas em situação de rua. Para alguns agentes públicos, a questão é tão grave que já deixa de ser social para se transformar em policial. Convidamos duas personalidades passenses para debater o tema, Claudia Fernandes S. Souza e Marcelo Coimbra. A eles perguntamos:

Na sua opinião, o poder público está sendo omisso nesse processo?

O que poderia ser feito para diminuir este problema?

 

 

 CLAUDIA FERNANDES S. SOUZA:      O problema das pessoas em situação de rua realmente não é só social, é estrutural e tende a se agravar a cada dia, pois mesmo antes da pandemia o desemprego e a grande massa de pessoas sem opção de trabalho é cada vez maior. Há vários motivos para as pessoas estarem em situação de rua como:  rompimentos dos laços familiares, doenças mentais, uso abusivo do álcool e outras drogas; também decorrentes de  desastres  como: inundações, secas, deslizamentos de terrenos; e os fatores estruturais que são a falta de trabalho, renda, habitação, entre outros. Segundo dados do IBGE (4º trimestre 2020), a população desempregada estava em 13,9 milhões de pessoas. Com a flexibilização dos contratos de trabalho e a reforma trabalhista aumenta a situação de miséria em que as pessoas se encontram. O pior é que a pandemia agravou ainda mais a situação dos que vivem do trabalho sem garantia nenhuma e concomitantemente o aumento no valor da cesta básica e produtos indispensáveis a uma vida digna. Acarreta que as pessoas que vivem do trabalho, perdendo seus empregos ou trabalhos esporádicos,  ficam em situação de vulnerabilidade e risco social e perdem suas casas, ou condições de pagar um aluguel, de se manter e manter à sua família. O auxílio emergencial do governo, da forma que foi feita, pelo aplicativo e não pelos profissionais da área da assistência social, excluíram os que mais precisam porque estes não possuem conhecimento, smartphones, nem  internet para conseguir a inserção no benefício. A partir deste entendimento a sociedade não pode generalizar como ruins as pessoas que estão em situação de rua e que nem sempre foram moradores de rua, mas que devido a diversos fatores tiveram que ficar nesta triste condição. Exposto tudo isto, é necessário sim uma política EFICAZ para o problema das pessoas em situação de rua. Esta política deveria contemplar a parte preventiva, ou seja, proporcionar oportunidade de empregos, centros de convivência para crianças e adolescentes buscando trabalhar a autonomia, capacitação profissional, esporte. Investir numa educação pública de qualidade, principalmente nos anos do ensino básico e fundamental. Programa de habitação popular digna.  Enquanto isto não se concretiza, há programas e serviços existentes para a população em situação de rua.

           

A assistência social, de acordo com a Política Nacional para Inclusão social da População em Situação de Rua, deve atender essas pessoas com os  serviços de  média complexidade, que é  o Serviço Especializado em Abordagem Social do  CREAS, buscando realizar trabalho social através de orientação e encaminhamento para acolhimento institucional. Tem também o Serviço Especializado para Pessoas em Situação de rua, realizado no Centro de Referência  Especializado para a População em Situação de Rua (Centro POP), que visa atender e ofertar atividades para o  fortalecimento de vínculos, a sociabilidade e autonomia destas pessoas, a partir de um espaço técnico que permita a higienização, alimentação, provisão de documentos e localização de referências familiares. No âmbito da alta complexidade, devem ser disponibilizados o Serviço de Acolhimento Institucional e o Serviço de Acolhimento em Repúblicas, ambos ofertando o acolhimento fixo e provisório contra o abandono e a perda de moradia e rompimento de vínculos familiares, de acordo com o perfil de cada grupo atendido. Estes equipamentos devem estar em parceria com as outras políticas públicas e instituições sociais e devem ter a contrapartida de financiamentos das três esferas do Governo, o que não acontece.

             

Em Passos há o Centro Pop Rua, do Centro de Referência Especializado em Assistência Social (CREAS), da  Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social, Trabalho e Renda (SEDEST)  .

           

Há também o Consultório na Rua (CNAR), programa da Secretaria Municipal de Saúde, que visa atender a população em situação de rua na área da saúde.

 

 

*CLAUDIA FERNANDES S. SOUZA - Possui graduação em Serviço Social pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho - Unesp de Franca/SP (1996). Especialização em Educação Especial (1998) e Gestão de Recursos Humanos(2008), ambos pela Unifran/Franca/SP. Mestre em Serviço Social pela Unesp de Franca/SP(2016).Trabalhou como diretora de RH no Lar São Vicente de Paulo de Passos/MG por mais de sete anos. Tem experiência na área de Serviço Social, atuando em: políticas públicas, educação especial, idosos, funerária e área jurídica. Participante do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Famílias - GEPEFA, da UNESP de Franca - durante o ano de 2015 - credenciado pelo CNPq. Docente designada da UEMG unidade Passos/MG, do curso de Serviço Social, desde 2015. Subcoordenadora do curso de Serviço Social da UEMG unidade Passos/MG de maio de 2018 a março de 2019. Coordenadora do curso de Serviço Social UEMG/Passos desde abril de 2019

 

 

MARCELO SILVA COIMBRA: A cidade de Passos como polo regional tem sua importância econômica e social para as demais cidades. Entretanto, este fator que, num primeiro momento é positivo torna-se um problema ao se captar ou permitir que outros problemas sociais vindos de vizinhos aqui se instalam.

Neste contexto insere os pedintes. A não adoção de uma política pública, tanto de  acolhimento dos residentes no próprio município, não somente os desampara como também torna público e visível o comportamento destas pessoas na via pública pedindo e permitindo com o tempo que outros venham e aqui se acomodam.

Há que se destacar que as residências e comércios da cidade “acolhedora” passam a ser alvo fácil destas pessoas, que no afã de satisfazer suas necessidades alimentícias e de vestuário passam a manter o hábito de passar nos mesmos locais diariamente.

Mantendo esse cenário a cidade (qualquer dela) se torna atraente e cômoda para este público.

Este comportamento repetido passa a ser um incômodo. Aliado a isso, temos um perfil de pedinte/usuário de drogas que sob o efeito da droga ou na necessidade de usar passa a ser agressivo e suspeito na abordagem ao doador. Uns irão acabar dando dinheiro pelo medo, risco e a forma até de exigência feita pelo pedinte.

Este contato direto tende a ser temeroso, ameaçador, coativo e o pior, sem resultado efetivo, pois o indivíduo não tem nenhuma perspectiva social de sair deste ciclo vicioso.

Por não se preocupar com os cuidados básicos de higiene e por também não ter nem local adequado para satisfazer suas necessidades fisiológicas nem contar com a compreensão e confiança de um morador em abrir as portas de sua residência ou comércio, ele irá usar a via pública, da mesma forma que dispensará os restos de alimentos.

Uma cidade que realmente tenha política pública social vai caminhar para diagnosticar e conhecer essa comunidade necessitada, dependente (tanto do auxílio quanto das drogas e bebida) e implantar locais adequados tanto para a recepção imediata dos que de fora chegam, adotando as medidas sociais iniciais, providenciando o seu retorno para a cidade de origem, bem como identificando a realidade de cada caso com adoção de medidas permanentes de atendimento alimentar, estrutural e de tratamento.

Muitos doadores fazem a primeira doação focando na "caridade" como uma forma de "lavar a alma". Mas o problema é bem maior.

Ambientes criados para simplesmente fornecer alimentação e banho... deixa a pessoa ainda mais “dependente” e sem imputar nenhum tipo de responsabilidade e disciplina, para que durante o atendimento se comporte de determinadas formas e receba também outros aprendizados (religião, procedimentos respeitosos, ...).

Diferente de um indivíduo que tem casa, roupa limpa, “uma cama para chamar de sua” e os mínimos de cuidados básicos para uma vida com um mínimo de dignidade, os pedintes precisam de que o Estado ocupe o papel de até mesmo educá-lo e aos poucos gerar no mínimo uma possibilidade de uma vida melhor (aí incluído até mesmo a internação para os casos necessários).  

Quando nada é feito no campo social deságua em riscos e perigo para toda a sociedade. A política de "enfrentamento" do problema não é pra amadores e não adianta debitar na conta da segurança pública. Os agentes de segurança quando possível irão fazer o atendimento, mas, o problema continua, sem o envolvimento maior e único que cabe a cada município através das suas estruturas de assistência social. Segurança entra quando falta o resto, ... aí chama a polícia.

A perda do foco é na sua origem. Os governos perderam a guerra para o Covid porque não souberam planejar o tamanho do problema. Por outro lado, a questão do pedinte é possível saber quem ele é, de onde veio, qual o grau de vicio (na droga e no álcool) o que faz com o que ganha.

Equipes multidisciplinares diagnosticando, monitorando, "despachando na chegada quem não é da cidade", tudo isto tem que estar bem delineado em um plano de enfrentamento deste aspecto social.

O problema é que entra governo, sai governo e alguns problemas serão "empurrados".

Se um governante soubesse o tamanho do custo que ele deixa na comunidade quando deixa de fazer ou faz errado durante seu mandato, ele pensaria duas vezes em até mesmo se candidataria".

  

*MARCELO SILVA COIMBRA - Graduado  em Segurança Pública, Academia da PM – BH – Pós Graduado em Segurança Pública – Fundação João  Pinheiro. Graduado em Publicidade e Propaganda – Fesp.  MBA em Marketing Estratégico – UNI-FACEF – Franca – Março 2011 a Dezembro 2012.  Trabalho de Conclusão de Curso: A aplicabilidade do uso do Planejamento Estratégico para Governos Municipais – Uma análise sobre a gestão pública eficiente. Módulo Extra: Módulo Internacional – Gestão Negócios e Cultura: Brasil e Argentina (realizado na UTN – Universidad Tecnológica Nacional – Buenos Aires). Especializações: Negociador de Ocorrências de Alta Complexidades 2002. Curso de Comunicação Aplicada a prevenção Criminal – BH – 2008. Elaboração de Projetos para Captação de Recursos – Sebrae 2013. Curso de Controle Interno: Fortalecimento da Gestão Pública – 2013. Atividades desenvolvidas: Assessor de Comunicação do 12º Batalhão da Polícia Militar. Coordenador de Operações do 12º BPM

 

 

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