Novo disco do U2 traz novas letras e outra ‘cara’ para clássicos da banda
U2 revisita o passado em ‘Songs of Surrender’, reescreve músicas como ‘Pride’ e regrava 40 sucessos
Imagine entrar na sua sala de estar e todas as suas coisas estão lá, mas de um jeito diferente. O sofá virou para outro lado, a estante está em outra parede, os porta-retratos mudaram de lugar. Essa é a sensação que Mark Kennedy, da AP, teve e relatou para os seus leitores depois de ouvir o novo álbum do U2.
Songs of Surrender é uma “reimaginação” de 40 canções do catálogo profundo do quarteto irlandês, espertamente apresentadas de One a 40. Pense nele como uma bela reforma na sua casa.
“Quero derrubar as paredes que me prendem aqui dentro”, Bono canta na nova Where the Streets Have No Name – versos que se encaixam perfeitamente nesse experimento sonoro. A nova versão da música é praticamente irreconhecível diante daquela que ficou famosa em 1987.
Esse é o objetivo do exercício liderado por Bono e The Edge. “Quando deixamos de lado nossa reverência pelas versões originais, cada música começou a se abrir para uma voz nova, autêntica desta época”, escreve The Edge no material de encarte.
Vemos triunfos e tropeços, mas ficamos com uma sensação crescente de que a arquitetura das músicas é forte de verdade, mesmo com algumas letras diferentes. A nova Vertigo tem uma instrumentação do Oriente Médio, e a Sunday Bloody Sunday levada por violão mais parece uma noite de microfone aberto em algum bar do que aquela imposição estridente pronta para as arenas. Mas as duas ainda são lindas.
Algumas faixas talvez até sejam melhores. Um dos primeiros sucessos da banda – 11 O’Clock Tick Tock – está mais suave, lenta e limpa do que a original. E você acredita que a nova The Miracle (Of Joey Ramone) é ainda melhor do que a de Songs of Innocence?
Muitas reformulações são relativamente simples, como Cedarwood Road, Peace on Earth, Bad e I Will Follow. A maioria traz uma sensação despojada, o que dá à voz de Bono pouco abrigo em meio a teclados melancólicos ou um violão incerto. Every Breaking Wave ficou cinematográfica, como algo que aparece nos créditos finais quando a tela de um drama angustiado escurece.
I Still Haven’t Found What I’m Looking For ganhou uma vibe meio cowboy e uma eletricidade inesperada. Desire traz Bono bem alto no seu falsete contra um dulcimer dedilhado. O efeito é hipnótico.
Get Out of Your Own Way foi refeita como uma música de Mumford & Sons, no bom sentido, e o novo Stuck in a Moment virou uma oração folclórica. A nova One ficou um pouco prejudicada por um efeito de coro, mas é uma música tão bonita que poderia brilhar mesmo se regravada como punk.
Ouvir a nova Sometime You Can’t Make It On Your Own é encontrar um ex que está quase irreconhecível. A retrabalhada With or Without You tem um ar de ameaça antisséptica.
Um efeito do álbum é pôr as letras de Bono debaixo dos holofotes, deixando suas palavras e imagens mais pronunciadas. A nova Ordinary Love surge como um poema tonal, a nova Invisible revela uma dor ainda mais profunda.
Algumas não funcionam, como quando a severidade de Red Hill Mining Town é cortada por trompetes, transformando-a efetivamente numa canção infantil sem alma. A nova Beautiful Day não é uma melhoria em relação à primeira: ficou descontraída e sinuosa, apesar de alguns versos bacanas.
Na nova Pride (In the Name of Love) a voz de Bono foi controlada e domada, perdendo a estridência e a raiva da original. E a nova 40 – com Bono dizendo, apropriadamente “Vou cantar uma música nova” – ficou mole e passiva.
Se você não é fã do U2, essa coleção não vai fazer muita diferença. Se você é megafã, vai se encantar com a mutabilidade da banda. E se você é fã casual, só pode admirar artistas dispostos a cruzar o próprio caminho.
Clique no clipe abaixo para ouvir a nova versão de Pride (In The Name of Love):