Há 100 anos Passos inaugurava a sua estação ferroviária...
Hoje abandonada, estação preserva acervo que corre o risco de desaparecimento
Há 100 anos, no dia 11 de dezembro de 1921, era inaugurado o ramal de Passos da Cia. Mogiana de Estradas de Ferro. O ramal de Passos foi inaugurado em seu primeiro trecho de 15 quilômetros ligando Guaxupé a Guaranésia, em 1912. Foi sendo prolongado aos poucos, chegando a Passos, onde terminava, somente em 1921. Em fevereiro de 1977, o tráfego de passageiros foi eliminado, sobrando os cargueiros, que, com o tempo, passaram a atender somente ao carregamento de cimento da fábrica de Itaú de Minas, e vindo não por Guaxupé, mas por São Sebastião do Paraíso, ali chegando pela antiga linha da São Paulo-Minas. Com isso, o trecho entre Guaxupé e S. S. Paraíso foi abandonado, e teve os trilhos retirados por volta de 1990. O trecho entre Paraíso e Itaú de Minas ainda tem seus trilhos, mas as cargas de cimento deixaram de circular já há anos e o abandono da linha é total. O trecho final até Passos teve também os trilhos retirados.
Atualmente completamente abandonada pelo Conselho Municipal de Patrimônio Cultural e pela administração municipal, que desde dezembro de 2020 retirou até a vigilância patrimonial dos prédios, esse patrimônio municipal vem sendo saqueado por marginais. O último prefeito que deu atenção para o bem público tombado pelo Patrimônio Cultural do Município e pelo Instituto Estadual de Patrimônio Cultural e Artístico de Minas Gerais (IEPHA-MG) foi Ataíde Vilela. No dia 26 de dezembro de 2016 a Prefeitura promoveu a entrega à comunidade da obra de restauro da Estação Cultura. A entrega teve uma solenidade e uma programação especial, que contou com exposições, lançamento de livros infantis e apresentações do coral da Primeira Igreja Batista de Passos e da Banda de Música do 12º Batalhão da Polícia Militar. Representantes de diversas entidades, como os conselheiros do Patrimônio Cultural de Passos, Clube do Carro Antigo e as associações dos Escritores e dos Ternos de Congo e Moçambique de Passos, participaram do evento. Sob a regência do maestro-tenente Antônio Marcos do Nascimento, a abertura foi da Banda da PM, que é Bem Cultural Imaterial do Município, com 50 anos de história em Passos e região. A frente de honra teve, entre outros convidados, o prefeito Ataíde Vilela, a secretária de Educação, Cultura, Esporte e Lazer, Pilar Aparecida Lemos Faria, a diretora de Cultura, Taciana Lopes Baptista, a presidente do Conselho Municipal de Patrimônio Cultural, Adriana Beatriz de Oliveira Polez Rocha, o vereador Hilton Silva (vice-presidente da Câmara), o professor de história Antônio Theodoro Grilo, que dá seu nome ao Centro de Memória, a secretária de Obras, Sônia Maria Oliveira, e o engenheiro Otaliro Silveira, diretor da empresa que fez a revitalização.
A revitalização da Estação Cultura, que abrigou a extinta estação ferroviária da Companhia Mogiana e, depois, Fepasa, foi uma obra emergencial da Prefeitura com o Conselho do Patrimônio para recuperar o complexo da deterioração. A execução do projeto custou R$ 411.894,60, com recursos do Fundo Municipal de Proteção do Patrimônio Artístico e Cultural (Fumpac) e do Município.
Foram recuperados o saguão de passageiros, telhado, piso, reboco e pintura. A obra conservou as características originais do complexo, que corresponde ao padrão arquitetônico das estações da Mogiana, conforme determina a lei do tombamento. Segundo Adriana Rocha, a obra foi a primeira etapa do grande projeto de restauro, estimado em mais de R$ 2 milhões – recursos que o conselho e a Prefeitura deverão buscar nos próximos anos. “Foram dez meses de uma luta para realizar a obra e agora vamos viabilizar os projetos de atividades culturais para esse espaço”, disse. Mas a segunda etapa nunca aconteceu...
Na solenidade, o professor Antônio Grilo fez um breve histórico da antiga linha ferroviária, desde a inauguração do ramal em 1921 até sua extinção em 1986, com a retirada dos trilhos ocorrida no início dos anos 90. O professor destacou também a importância de preservar os prédios da estação, por causa da importância histórica e cultural da ferrovia para o município e também pelo acervo de documentos jurídicos, legislativos e outros conservados no Centro de Memória e que estão à disposição de pesquisadores. “A cidade de Passos deve estar sobejamente honrada de ter um centro de memória, porque a maioria das cidades não tem um centro memória por não terem sido capazes de preservar sua documentação”, disse, após citar a conservação de um manuscrito jurídico de 1848, quando Passos ainda era chamada de Vila Formosa do Senhor Bom Jesus dos Passos. E, lamentavelmente, 5 anos depois, todo o complexo está totalmente condenado ao abandono.
A ESTAÇÃO
A estação de Passos foi inaugurada como estação terminal do ramal que leva seu nome, em 1921. Foi ativa pelo menos até 1977, quando cessaram de correr os trens de passageiros do ramal.
"Creio que não contarei nenhuma novidade a você, mas esta fotografia dos anos 1920 me entusiasma pelo seu potencial documental da tipologia arquitetônica das estações da Mogiana. Não sei se o tipo ou padrão arquitetônico desta estação poderia ser o segundo, terceiro ou quarto padrão adotado pela Mogiana, mas note que: A) é exatamente o mesmo padrão (desenho, dimensões, detalhes ornamentais, etc. de inúmeras outras estações da Mogiana, como por exemplo as estações do trecho Campinas-Jaguariuna da ABPF, construídas após retificações da linha, substituindo outras de padrão mais antigo, de alvenaria de tijolos à vista (Carlos Gomes-velha, por exemplo, e Desembargador Furtado-velha), evidenciando a importância que a arquitetura dos seus prédios tinha para a própria empresa; B) o mais importante: apresenta muito bem o padrão de modulação desse padrão ou tipo de estação, com um corpo central que abriga as acomodações básicas (provavelmente sala do chefe, saguão, etc.) e que pode ser acrescido de extensões conforme necessário em cada localidade; este caso parece exemplar justamente porque mostra muito bem o núcleo ou módulo central, mais elevado que o resto, e um acréscimo (não necessariamente feito depois, pode ter sido edificado na mesma época do núcleo) de um dos lados, porém sem um equivalente simétrico do outro. Por ai vê-se claramente a previsão de que o prédio inicial pudesse ser aumentado; C) o formato e decoração das janelas, a decoração dos panos das fachadas, enfim, toda a 'cara' das fachadas foi intensamente copiado na arquitetura civil, exemplificando a influência que a arquitetura ferroviária exerceu sobre o 'gosto', a referência estética que criou para toda a população. Isto é apenas mais um dos muitos aspectos em que a ferrovia definiu muito do caráter da nossa cultura, e esta foto permite percebê-lo muito bem" (Júlio Moraes, 09/2007).
“Falava-se na época que a linha de Passos seria prolongada até a cidade de Piumhi e que há cortes nos morros até hoje feitos sem que os trilhos jamais tenham sido colocados. Há mapas da época que mostram o percurso planejado que ligaria as duas cidades. Em 1986, estava já "fechada e em mau estado", segundo o relatório da Fepasa, "mas com todas portas e janelas ainda lá", como se isso fosse uma grande virtude. A situação havia mudado em 2001: "Tanto o prédio da estação quanto o do antigo armazém estão em muito bom estado, e uma placa de inauguração indica que eles funcionam como centro de memória da cidade, o que não pudemos verificar, pois devido ao feriado estava tudo fechado. Os trilhos realmente já foram retirados" (Rossana Romualdo, 07/2001).
Ralph Mennucci Giesbrecht, em um site que mantem na internet sobre as estações ferroviárias do Brasil, relata o que viu numa visita que fez à estação de Passos: “No finalzinho de 2006, eu finalmente visitei o local com a Ana Maria, que ia fotografando enquanto eu olhava tudo aquilo. Um enorme pátio, digamos, gramado, e do outro lado algumas casas de turma. Nem sombra de trilhos; alguns restos de guias originais de ruas do centro (granito?) jogadas por ali. A estação, mais ou menos: era usada como uma espécie de centro de memória, ainda, mas há madeiras em mau estado. O prédio era muito bonito, bem estilo Mogiana anos 1920-40. Ficava meio afastado da cidade, aquilo certamente era o limite da zona urbana em 1921 quando o trem chegou. Um belo lugar, mas então já cercado de área urbana. Ao longe, no final do pátio, casas que pertenceram a uma usina que ficava fora da cidade. Um ou outro depósito. Os postes da estação eram de ferro fundido, havia diversos, mas estavam sem as esferas de vidro para iluminação. Fazia falta um trem chegando ali, como era até 1977, buzinando com as diesel e mais antigamente, apitando com o som das vaporosas que certamente ecoava ao longe. Em 2014, o ainda era centro de memória, mas bastante abandonado em sua conservação: "O espaço foi inaugurado em 1994 e desde então, nenhuma reforma ou manutenção foi feita no prédio. Rachaduras, umidade nas paredes, fiações expostas, lâmpadas queimadas e com mau contato, computadores que não funcionam e o mais preocupante: todo o acervo está se deteriorando. 'Tudo que você precisa saber de Passos precisa consultar aqui, mas não tem nada para preservar, fotos, documentos, tudo está sendo consumido por carunchos', dizia um frequentador" em 2014.
Guarde as fotos nesse álbum feito por Cesar Tadeu Elias 100 anos depois da inauguração (pode ser a única coisa a sobrar para o futuro!):