Ex-aluno da rede de ensino de Passos lança ‘O Coelho’ na Bienal de São Paulo

Obra é uma releitura de Alice no País das Maravilhas em versão nacional, do autor

Ex-aluno da rede de ensino de Passos lança ‘O Coelho’ na Bienal de São Paulo
O passense André Luis Nascimento foi aluno da escola da zona rural da Mumbuca (Divulgação)

O passense André Luis Nascimento foi aluno da rede municipal de ensino na escola da zona rural da Mumbuca, Dr. Manoel Patti. Leitor ávido desde que foi alfabetizado cresceu participando e ganhando concursos de redação e poesia, além de escrever peças teatrais para todas as escolas que frequentou. Aos 14, compôs a letra do hino da E. M. Dr. Manoel Patti. No próximo dia 9 de julho este jovem prodígio terá seu livro ‘O Coelho’ lançado na Bienal Internacional do Livro, no Expo Center Norte, em São Paulo.

Graduado em Matemática pela Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg) Unidade Passos; graduado também em Letras pela Unimes e pós-graduado em Ensino de Língua Inglesa pela Cruzeiro do Sul/Unifran. Em 2013, foi convidado para escrever o roteiro do musical Aladdin ,da principal escola de música da cidade. “Após retornar de um curso de inglês na Oxford College House, em Londres, iniciei a escrita de “O Coelho”, inspirado, de forma sombria, na história de Lewis Carroll, que me fascina desde criança. Atualmente, leciono inglês, português e literatura, além de trabalhos como tradutor. Moro com meu esposo e nossos sete cães-filhos”, contou.

Nascido na zona rural de Passos, na comunidade Mumbuca, desde pequeninho era sonhador. Já dizia ao seu pai que iria falar inglês, morar fora, ser cantor, criar filmes e desenhos e conhecer o mundo inteiro. “Lembro-me de ter o apoio de muitos professores, o que fez total diferença, mas é claro que sempre havia as pessoas da comunidade, da própria família e outras crianças que olham torto para gente, acham que somos malucos e não vamos dar em nada na vida, porque não ‘temos os pés no chão’, enganados”, disse o autor.

Nascimento disse que jamais vai se esquecer do seu melhor presente quando criança, por volta de uns 10 anos. “Ganhei de um tio um dicionário de inglês. Foi com ele que tudo começou. Foi difícil crescer sentindo que eu não me encaixava naquele lugar e todos me achavam estranho. Os meninos, na zona rural, são ensinados a plantar alguma lavoura, cuidar de gado, ter uma namorada, casar, ter filhos e possuir uma fazenda. Eu não queria nada daquilo. Na adolescência ficou muito pior. Além dos sonhos que pareciam ser oprimidos pela realidade do local, começou a autodescoberta de quem eu era, minha sexualidade, sentimentos e a tristeza profunda por me sentir que era errado ser como eu era e que nunca seria motivo de orgulho para a família”, desabafou.

O jovem contou que tratou de estudar muito e se tornar fluente no inglês. “No ensino médio, vim para Passos e aproveitei todas as oportunidades de estudo e cursos que ganhava de familiares. Entrei na faculdade de Matemática com 17 anos e arrumei o primeiro emprego. Com o dinheiro que guardei, fui para o intercâmbio. Durante esse período, experimentei de tudo: teatro, música, desenhei cenário para peça teatral, mas nunca me encontrava. Foi em Londres que tudo começou, quando comprei um original de Alice no País das Maravilhas, em inglês e recobrei a memória que tinha de criança. O filme da Disney era minha válvula de escape: imaginar que poderia haver todo um outro mundo cheio de aventuras, eu só precisava encontrar o maldito buraco (risos)”, salientou.

Lá, o processo de escrita de O Coelho começou. “Queria uma releitura, uma versão nacional, minha. Fluiu muito rápido, pois bastou colocar na minha protagonista muito de mim: uma adolescente que queria muito mudar a vida, desejava mais que tudo viver uma aventura, pois se sentia deslocado, não pertencendo a lugar nenhum. É aí que o livro se conecta aos jovens de hoje: existe muito desse sentimento, principalmente pós-pandemia. Quem sou eu? Por que não me sinto suficiente? Por que tenho que corresponder a tantas expectativas? Eu sou capaz? Eu posso ser um herói?”, questionou.

Quando voltou, finalizou a escrita e passou a enviar o original para editoras tradicionais. “Fui rejeitado por todas. Não satisfeito, paguei uma primeira impressão em uma gráfica, o que foi muito traumatizante, pois não houve correção, a capa era uma imagem do Pinterest  e divulgação zero. Quando vi meu trabalho cheio de erros, quis desistir, me senti um fracassado”, desabafou.

Logo veio a pandemia e o jovem escritor acabou adiando a busca por uma editora. “Nesse período, escrevi mais dez livros, fiz muitos cursos e aprendi muito sobre o mercado editorial, até que O Coelho caiu nas mãos da maravilhosa Mari Vieira, uma escritora, revisora e editora de Campinas. Através dela, meu livro chegou às mãos da Cabana Vermelha e até chegou a ser transformado em projeto de filme e enviado para uma produtora no Rio de Janeiro – imagine o ápice da minha loucura. Chorei muito. Foi nesse dia que, pela primeira vez, senti que eu tinha um dom e sabia fazer algo bem feito”, contou Nascimento.

Infelizmente, o dono da produtora perdeu a filha de forma violenta e acabou não levando o projeto para frente, até então. Finalmente, depois de muita espera, O Coelho teve sua segunda edição lançada pela Editora Cabana Vermelha no dia 30 de maio e está em pré-venda. Também foi em maio que a editora o convidou para ir junto a ela e alguns outros escritores para a Bienal Internacional do Livro, em São Paulo, algo que ainda me faz tremer e morrer de medo e pedir que me belisquem o tempo todo. Imaginem o orgulho, a concretização de um sonho, de um dom”, disse.

O menino lá da roça, que muita gente achava que era doidinho, vai com seu livro para uma das maiores bienais do mundo. Da Mumbuca para uma Bienal Internacional. “Já avisei a todos que vou correr atrás da Thalita Rebouças. Não posso, agora somos colegas de profissão. É realmente uma honra e algo que gostaria de compartilhar com toda a cidade, com todas as crianças e jovens, principalmente de lugares estereotipados, acorrentados na ideia de que se você nasce ali, você está fadado a ser algo já definido por todos ao seu redor. E não quero dividir isso com todo o mundo para que me elogiem ou por ego. Eu escrevo por amor; no Brasil, não se faz dinheiro escrevendo, já foi essa época. Eu quero alimentar sonhos, eu quero que olhem para mim e digam: poxa, se ele pode, eu também posso, e muito mais. Quanta criança tem por aí que é mestre em desenhos, música, jogos, esportes e tantas outras áreas, mas acabam deixando de lado, porque parece que estamos em um lugar distante e escutamos o tempo todo que devemos ter filhos, casa, carro e uma poupança”, ensinou.

O jovem talento vai além, questionando e refletindo de que não tem nada de errado com isso, mas e nossa alma? Nossos sonhos? O que somos de verdade? Quem ou o quê vai preencher isso? “Se eu posso estar em uma bienal internacional, por que as crianças dessa cidade não podem estar sonhando trabalhar na NASA, estar no ITA, em uma rede de TV, escrevendo roteiros para a Netflix ou desenhando logos para as marcas mais famosas do mundo?”, questionou.

 

 

COMO ADQUIRIR

Nascimento deixa um recado para todos que queiram o prestigiar e o nome da cidade de Passos, que carrega com orgulho, e, para todos que queiram viver uma superaventura, corram para o site da Editora Cabana Vermelha ou suas redes sociais, todas com o nome André L. Nascimento, para adquirir o livro O Coelho, que está em pré-venda por R$ 45,90, com direito a brindes para os primeiros compradores e marca-páginas. Para as pessoas de Passos ou quem fizer a retirada na Bienal, o livro será autografado e terá dedicatória mais que especial. Em Passos, provavelmente em agosto, haverá uma tarde de autógrafos.

O livro conta a história de Alice, uma garota brasileira sempre responsabilizada pelas frustrações da mãe e que aprendeu a se esconder em fones de ouvido e moletons escuros. Vítima de bullying na escola por ser muito maior que as outras garotas, deseja mais que tudo não viver a vida que tem. Seu desejo é tão forte que monstros começam a surgir por São Paulo, onde mora, e persegui-la, loucos para destruírem o único presente que os avós, assassinados em sua frente no sul do Brasil, lhe deixaram: um livro de Alice no País das Maravilhas. Não bastasse, a garota passa a ver o gato da avó a falar, o qual havia desaparecido no dia do assassinato, mais de dez anos atrás, além de descobrir que existem cópias suas pelo mundo e que são todas parte de um ritual para a existência de uma força macabra escondida nos confins do planeta.

A cada enrascada, Alice descobre que as personagens do livro de sua homônima eram na verdade avisos para tudo que está acontecendo em sua vida e o famoso conto de fadas vira um quebra-cabeça, um jogo de mistérios e pistas a serem desvendadas, como o se o livro antigo fosse uma bíblia para salvar a Terra de um grande mal.

É quando surge O Coelho, um rapaz que nunca revela seus olhos e faz parte de uma sociedade protetora de “Alices” e que, assim como no livro de Lewis Carroll, está sempre atrasado e não consegue salvá-la. Entre temas importantes, como bullying, relacionamentos problemáticos entre pais e filhos, vitiligo, identidade de gênero e protagonismo feminino, a aventura nos leva a repensar como uma garota com autoestima destruída conseguirá ser nossa heroína se ela mesma nunca acreditou em seu potencial?

É uma história de superação, aprender a encontrar forças em tempos difíceis e enxergar beleza em todos os corpos, cores e formas, mas acima de tudo, em si mesmo. Só assim nossa heroína será capaz de despertar seus poderes e enfrentar seu pior monstro: ela mesma.

“Agradeço a todos os passenses que me apoiam, conto com todos na Bienal e comprando o livro para fazermos uma tarde de autógrafos linda, mas, acima de tudo, com todos voltando a sonhar, principalmente depois de um período tão triste em nossas vidas. Muita fé, muita coragem e muitos sonhos para que a vida volte a ser uma aventura incrível”, finalizou.